Um novo documento produzido pelo governo federal afirma que as crianças podem se identificar como transexuais e que a lei deve tratá-las dessa forma.
O guia “Todas as Mulheres: Dignidade, Cidadania e Direitos Humanos para Travestis e Mulheres Trans” foi lançado em outubro pelo Ministério das Mulheres e Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). O documento é fruto da 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres.
A proposta do guia é apresentar fundamentos legais e parâmetros de direitos humanos contra a discriminação. O documento traz informações relevantes sobre as pessoas que se identificam trans, como um resumo de quais leis tratam do tema e detalhes de como obter o reconhecimento do nome social.
Contudo, além de cobrarem que os adultos que se identificam como transexuais tenham os mesmos direitos das mulheres biológicas, o guia defende a adoção de uma legislação que reconheça a existência das crianças trans e que garanta proteção e saúde diferenciadas a elas.
Argumentos
O guia reforça a orientação ONU, que no ano passado recomendou oficialmente ao Brasil reconhecer legalmente a existência de crianças trans e adotar medidas para garantir a identidade de gênero, integridade física e psicológica e liberdade de expressão delas.
A Organização das Nações Unidas Mulheres no Brasil e ONU Direitos Humanos para a América do Sul são parceiras na construção do documento.
O documento justifica que “as crianças LGBTQIA+, inclusive as meninas trans, também têm todos esses direitos” porque “travestis e mulheres trans também foram crianças” e que muitas tiveram uma infância marcada por discriminação e “hiperpatrulha de gênero”.
Segundo a cartilha, essas perseguições desencadearam bullying, violência e cicatrizes físicas e mentais.
O guia sugere que o Estado realize ações de conscientização pública e implementação de medidas de apoio e segurança aos adolescentes trans, adote medidas para proteger crianças trans que sofreram bullying, discriminação, assédio e qualquer outra forma de violência, e desenvolva programas específicos para a saúde mental das crianças e adolescentes trans, que estariam sujeitas a um risco maior de cometer suicídio e mutilação.
O documento não trata diretamente de intervenções físicas, como o bloqueio hormonal ou operações de redesignação sexual.
Inversão da interpretação
O memorando diz que a autodeterminação de se identificar com um determinado gênero que não o biológico se fundamenta em “vivências e experiências observáveis pelas ciências sociais, humanas e políticas”.
O texto equipara o direito à autoidentificação a outras características, como raça e etnia. Mas o documento também afirma que a identidade de gênero é um aspecto essencial da personalidade de cada pessoa.
Segundo Shannon Sauer-Zavala, professora de psicologia e psicóloga clínica da Universidade do Kentucky, nos EUA, personalidade é a maneira característica de pensar, sentir e se comportar de alguém. Estudos mostram que a personalidade pode mudar no decorrer da vida, inclusive na fase adulta.
Além disso, a própria Convenção sobre os Direitos da Criança, na qual o guia baseia parte de seus argumentos, deixa claro que a criança tem um processo de evolução de maturidade. O documento menciona alguns artigos, como o 12, segundo o qual a criança tem direito a formular seus próprios juízos e expressar suas opiniões livremente sobre todos os assuntos que lhe digam respeito. A segunda parte do texto da Convenção, porém, diz: “levando-se devidamente em consideração essas opiniões, em função da idade e maturidade da criança”.
Mais à frente, o guia ressalta o direito da “liberdade de pensamento consciência e crença”. A própria convenção diz que serão respeitados os direitos e deveres dos pais de orientar a criança com relação ao exercício de seus direitos de acordo com a evolução de sua capacidade.
Procurado pela Gazeta do Povo, o Ministério das Mulheres disse que a 5ª Conferência Nacional de Políticas para as Mulheres (5ª CNPM) promoveu painéis temáticos, que contaram com mais de 40 debatedoras, abordando temas como saúde, educação, justiça de gênero e étnico-racial, violência política e economia.
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