Uma empresa estatal acumula prejuízos recordes e pede socorro até para pagar salários.
O governo que a controla depende de empréstimos para cobrir despesas do dia a dia, mas o ministro da Fazenda acha “delírio” falar em crise fiscal.
E o partido que comanda o governo insiste que é o Estado quem deve induzir o crescimento econômico. Quem está em crise, diz a sigla, é “o capitalismo global”.
Pouca gente se surpreende com o que se diz e faz nos Correios, na gestão Lula e no PT. Nem por isso o que dizem, fazem ou deixam de fazer é menos relevante. Assim como ocorre com o déficit das contas públicas, a fatura da tentativa de salvação da empresa tende a ser paga por quem sustenta o Estado.
PT diz que Tarcísio faz “laboratório da redução radical do Estado”
A defesa da atuação do Estado na economia está em uma “resolução política” aprovada dias atrás pelo diretório nacional do PT, com vistas a 2026.
O documento prega que o partido “deve responder à regressão social proposta pela direita” e conter a privatização de estatais, bancos públicos, saúde, educação e previdência.
(Segundo o texto, o governador Tarcísio de Freitas seria “o principal interlocutor do projeto neoliberal e privatista” e teria transformado São Paulo em “laboratório da redução radical do papel do Estado”.)
A posição do PT é coerente com sua história. Para ficar no exemplo dos Correios, uma das primeiras iniciativas de Lula no atual mandato foi tirá-los da lista de estatais à venda.
Fora isso, os planos do petista para a empresa são um mistério até hoje. Ele a colocou nas mãos de um advogado do grupo Prerrogativas e não falou mais sobre o assunto.
Lula deve satisfações sobre a ruína dos Correios

Opine: Você é a favor do socorro bilionário do governo aos Correios?
O advogado pediu demissão em julho passado, colecionando perdas bilionárias e pondo a culpa em Jair Bolsonaro. Lula esperou dois meses para nomear um sucessor. Continuamos sem saber o que ele planeja para os Correios.
(Lula também nunca deu satisfação sobre a desgraça que as gestões petistas causaram ao fundo de pensão da estatal, e consequentemente a empregados e aposentados. Uma das causas do prejuízo dos Correios, longe de ser a única, é a cobertura do rombo do Postalis.)
No 36.º mês de gestão, governo corre para salvar Correios
Se faltou senso de urgência no trato da estatal nos primeiros 35 meses de gestão, sobra correria neste 36.º – o mês das entregas de Natal. Sem uma injeção de recursos do Tesouro (leia-se contribuinte) ou um empréstimo bancário garantido por ele, a empresa não conseguirá pagar o 13.º salário, no dia 20, nem os vencimentos de dezembro, no fim do mês.
Nesta semana, Lula assinou decreto que permite a estatais “não dependentes” do Tesouro – caso teórico dos Correios – apresentar um plano de reequilíbrio econômico-financeiro e assim evitar a reclassificação para “dependentes”. O documento também dá respaldo a empréstimos com garantia da União.
O decreto foi feito sob medida para os Correios. Ele blinda técnicos que temiam autorizar o empréstimo à estatal e depois serem responsabilizados em caso de calote. E livra o ministro Fernando Haddad de uma encrenca: caso a estatal virasse formalmente dependente do Tesouro, suas contas entrariam para o Orçamento da União, ampliando o rombo do governo.
Diz o Planalto que o tal plano de reestruturação passará por “processo rigoroso de aprovação”. É de se perguntar qual o rigor possível nos poucos dias que faltam para rodar a folha de pagamentos dos Correios.
Como os Correios vão sobreviver no mercado de entregas? Lula não diz
Mais do que isso, é de se questionar o que a empresa fará para sobreviver na disputa feroz pelo mercado de encomendas, sem a agilidade nem a musculatura financeira das potências privadas que ganharam a preferência do consumidor.
(Documentos obtidos pelo Globo mostram que, apenas entre janeiro e dezembro, a média de encomendas transportadas pelos Correios caiu 16%. No mesmo intervalo, o índice de entregas no prazo baixou de 98% para 77%).
Um ou outro membro do governo reconhece a gravidade da situação. Haddad, por exemplo, vem falando – agora, no 36.º mês de Lula 3 – que a empresa precisa de uma “reinvenção”.
Lula não fala. Mas provavelmente em 2026 o ouviremos bradando contra privatizações e defendendo o “Estado indutor”.


